sábado, 9 de julho de 2011

India is not a destination, it is a destiny


Não importa onde nascemos, o nosso espírito é daqui. Podemos chamar de muitas coisas mas a nossa alma, aquele lado de nós que acredita no corpo não físico, que reza a um deus ou que tem fé na espiritualidade, essa parte de nós nasceu na índia.
Para lá do lixo que cobre as ruas, do pó que cobre as roupas, do óleo que cobre os cabelos, dos panos que cobrem as pessoas a índia é isso – o sagrado.
E por essa razão viajar para a índia não é coisa que se escolha, é destino que tem de estar escrito nas linhas da nossa mão, marcado nos chakras, nas zonas de energia mais básicas do nosso ser.
Visito o ashram de Amritapuri e aqui conheço a guru a quem chamam “the hugging saint”, a mulher que cura o mundo com o seu abraço.
Num ashram as pessoas vivem a espiritualidade seguindo um guru e os seus ensinamentos. Há centenas de lugares assim na índia, segundo a tradição Hindu - e não falamos apenas de religião, o hinduísmo é uma filosofia, um modo de vida que está presente na cultura indiana desde a sua origem – esta experiência faz parte do caminho do homem na busca da libertação. A vida deve conter este viver em retiro, em abnegação e abstenção dos prazeres mais mundanos, em total comunhão com o sagrado, qualquer que seja a sua manifestação.
Aqui o guru é uma mulher, a quem chamam Amma, a mãe.
Dizem-me que quem vem a este lugar o visitou antes, em vidas anteriores…
Aqui consulto os astrólogos védicos: “Eu vou indicar-te vários procedimentos diários para tu fazeres e tu não vais perguntar porquê, vais apenas experimentar.”
Mas desde que o avião aterrou em Mombay que esta palavra não sai da minha cabeça: “porquê?”
Índia é este desafio, não questionar, não procurar entender, apenas aceitar.
Índia é cor e brilhos, sedas, pedras preciosas, ouro e a simplicidade perfumada de grinaldas de jasmim nos longos cabelos das mulheres.
Estou em Kerala, chamada de “God’s own country”.
Pelos canais verdes, de plantas subaquáticas, deslizam os house-boats, barcos de pescadores, tradicionais, transformados em pequenos palácios flutuantes, onde os turistas bebem a paisagem deslumbrante das margens. As aldeias de pescadores de casas escondidas entre as folhas de bananeira de intenso verde, os lagos, os rios, do outro lado o mar, todas as águas recebemos aqui. As mulheres lavam os saris nas margens e as crianças ensaboadas saltam mergulhos gritados.
Índia é isso, uma grinalda de flores, brilhantes, frescas, no pescoço de um deus. Cinzas desenham a testa de um brahmam e nas crianças lápis negro assinala com uma pinta o terceiro olho, o ponto entre as sobrancelhas que abre a espiritualidade.
“When you see a temple, you worship”.
Acredita-se que buda passou por aqui, nas margens do lago Punnamada, nos arredores de Alappuzha está sentado Karumadikuttan, uma das mais antigas imagens de Buda (acredita-se que entre séc. 9 e 14).
Visito os templos de impossíveis esculturas brilhantes feitas na pedra, os complexos de altares e zonas sagradas tradicionais de Kerala.
Visito Mannarshala, dedicado ao deus cobra, o maior da região. O templo está desenhado no meio de densa floresta repleta de cobras e de imagens de granito do deus Nagaraja e de Sarpayakshini.
Aceito. Aqui aceitamos. Aceitamos o chá doce, o leite em pó, as especiarias e o arroz cozinhado sem gordura. Aqui comemos com as mãos, sentados no chão, com a comida em pequenos montes dispostos numa folha de bananeira.
Aqui o olhar é reservado, a roupa modesta, os casamentos arranjados nos cultos a Shiva, e a vida vivida na sua forma mais tradicional.
Aqui dançam Kathakali, a forma de teatro mais antiga do mundo, a que conta as estórias sagradas do Mahabharata.
Vivo o dia de Visnhu, o ano novo. A cidade rebenta em fogo-de-artifício, as famílias hindus decoram com frutas e flores os altares das casas.
Na índia não se sabe, ninguém sabe. Mas todos acreditamos.
Ninguém entende, mas todos confiamos.
Quem recusa uma ida a um templo? A presença num ritual? Quem deita fora sem pensar duas vezes a puja oferecida depois de uma celebração… quem não olha as flores rosa que decoram Shiva ou as amarelas, preferidas de Krishna?
Índia é isto, aceitas?